A revolução tecnológica tem permeado todos os aspectos de nossas vidas. E a advocacia não vive uma exceção nesse sentido. No Brasil, assim como em todo o mundo, a tecnologia não apenas impactou o setor jurídico no geral, ela também demandou novas habilidades e conhecimentos dos profissionais do Direito.
Neste post, exploraremos as expectativas de especialistas em relação às habilidades e perspectivas de atuação no setor jurídico no Brasil, destacando o valor da pesquisa e a importância de mapear competências. Além disso, abordaremos um estudo relevante realizado em parceria entre a FGV e a Thomson Reuters, que lança luz sobre essas questões cruciais.
Conheça a pesquisa
A realização de pesquisas e a elaboração de um mapa de competências são elementos cruciais para entender e preparar os profissionais do Direito para o presente e o futuro. O estudo conduzido pela FGV em parceria com a Thomson Reuters, intitulado "Formando a advocacia do presente e do futuro: habilidades e perspectivas de atuação", exemplifica a importância desses processos.
Realizado pelo CEPI (Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação), da FGV, reconhecido como um centro importante para estudar como a tecnologia influencia o campo do Direito no Brasil, a pesquisa tem alcançado grande notoriedade. Uma das principais áreas de estudo dessa entidade se concentra em entender como os avanços tecnológicos são capazes de afetar a profissão jurídica.
O "Formando a advocacia do presente e do futuro: habilidades e perspectivas de atuação" examina como bancas adotam tecnologia, identificam habilidades cruciais para os advogados e mapeiam limitações na formação jurídica. Os resultados visam orientar a compreensão da teoria, explorar desafios e oportunidades na adoção de tecnologia no Direito e moldar a futura formação dos profissionais da área.
O relatório ressalta os resultados essenciais, que foram obtidos por meio de uma combinação de pesquisa bibliográfica, levantamentos quantitativos e entrevistas qualitativas.
Essa abordagem proporcionou uma compreensão aprofundada da situação das bancas de advocacia no Brasil em meio às transformações tecnológicas. Além disso, serviu como base para a elaboração de um raio-x que identifica as habilidades e competências indispensáveis para os profissionais do Direito.
Cenário de incorporação de tecnologia nos escritórios de advocacia
Segundo a pesquisa, a principal mola propulsora da adoção de novas tecnologias foi a necessidade de modernizar as atividades, algo apontado por 100% dos grandes escritórios. Aprimorar os serviços (68%) e enfrentar o uso crescente de processos eletrônicos (64%) também marcaram presença relevante no estudo.
Essa transformação tecnológica representa um ponto crucial na evolução da prática jurídica e oferece uma série de benefícios significativos.
Primeiramente, a modernização dos escritórios de advocacia por meio da tecnologia tem se manifestado na digitalização de documentos e processos. A transição do papel para o digital reduz a necessidade de espaço físico para documentos, economizando custos e tornando esses materiais mais acessíveis e fáceis de serem localizados.
Além disso, a busca por informações e a recuperação de dados ganham eficiência extra, agilizando o trabalho dos advogados. A automação de tarefas rotineiras também é uma parte essencial da modernização. Com a utilização de softwares especializados, é possível automatizar a geração de documentos, o acompanhamento de prazos e até mesmo a análise de contratos. Isso não apenas economiza tempo, mas também reduz erros humanos, melhorando a qualidade do serviço prestado aos clientes.
No que diz respeito ao aperfeiçoamento do que é produzido, a tecnologia desempenha um papel fundamental na coleta e análise de dados. Os escritórios conseguem utilizar análises preditivas para prever resultados de casos com base em jurisprudência passada e estatísticas. Isso ajuda os advogados a tomarem decisões bem informadas e aconselhar melhor seus clientes.
Com tantos benefícios, não é à toa que, entre os participantes da pesquisa, constatou-se que mais da metade dos escritórios ouvidos (54%) expressaram a intenção de aumentar seus investimentos em tecnologia em 2023. E 32% planejam manter o mesmo nível de 2022. Isso significa que a importância estratégica desses gastos parece ser justificada para 86% dos entrevistados.
O impacto da Covid-19
A pandemia da COVID-19 causou um impacto profundo e abrangente nos escritórios de advocacia no Brasil. A rápida disseminação do vírus e as medidas de distanciamento social exigiram mudanças significativas na forma como os advogados conduzem seus negócios e prestam serviços jurídicos.
Uma das transformações mais notáveis foi a adoção massiva do trabalho remoto, apontado por 92% dos pesquisados. Escritórios que dependiam de um ambiente físico se adaptaram a uma nova realidade virtual. Isso envolveu a implementação de tecnologias de comunicação, como videoconferências e colaboração online (lembrado por 83%), para manter a comunicação interna e com os clientes.
A digitalização de documentos e processos legais também se tornou uma prioridade. A necessidade de acessar informações de maneira rápida e eficiente, independentemente da localização física, levou à implantação de sistemas de Gerenciamento Eletrônico de Documentos (GED), por exemplo – lembrado por 87%.
Observa-se uma quantidade expressiva (entre 50 e 70%) de utilização de ferramentas de proteção de dados, melhoria da experiência do cliente, legal design, visual law, jurimetria, educação e consultoria.
O surgimento de novas áreas e serviços jurídicos
Um dos aspectos abordados na pesquisa foi o surgimento de novas áreas e serviços jurídicos, que refletem as novas demandas dos clientes e as possibilidades oferecidas pela tecnologia. A pesquisa revelou que essa foi uma realidade em aproximadamente metade dos escritórios (52%) nos últimos cinco anos, sendo frequente nos escritórios maiores - com 90% das respostas positivas.
As áreas e funções mais criadas pelos escritórios foram as relacionadas à proteção de dados (39%) e ao marketing (35%), seguidas por legal design, gestão de inovação e serviços específicos para demandas jurídicas de tecnologia. Análise de dados e programação, além de legal operations, também figuram no ranking.
Essas áreas e funções demonstram a necessidade dos escritórios:
Adequarem-se às normas de proteção de dados pessoais, como a LGPD;
Comunicarem-se melhor com seus clientes e potenciais clientes;
Oferecerem soluções jurídicas mais criativas e eficientes;
Utilizarem ferramentas tecnológicas para otimizar seus processos e resultados;
Gerenciarem recursos humanos, financeiros e operacionais de forma mais estratégica.
A principal motivação para a criação de novas áreas, segundo os entrevistados, foi a demanda de clientes (33%). A ela se seguiu a inovação na prestação dos serviços (30%) e a melhoria da estrutura tecnológica do escritório (29%). A iniciativa dos profissionais apareceu em 17% das respostas, sendo essa porcentagem maior nos grandes escritórios, que tendem a possuir mais recursos para criar novas áreas, seja por razões internas ou pressões externas.
A pesquisa também mostrou que a influência da tecnologia na criação de novas áreas foi alta para 60% dos escritórios que criaram novas áreas, média para 35% e baixa para 5%. Isso indica que a tecnologia é um fator determinante para a inovação e a competitividade dos escritórios de advocacia no mercado atual.
O estudo apontou que as bancas buscam se adaptar às novas demandas do mercado jurídico, mas ainda há espaço para avançar em termos de inovação, tecnologia e gestão. Os escritórios que conseguirem se antecipar às tendências e às necessidades dos clientes terão mais chances de se destacar e se consolidar no cenário jurídico nacional e internacional.
Competências e habilidades necessárias para a advocacia
Os resultados da pesquisa revelam que as competências jurídicas ainda são vistas como as mais importantes para a atuação na advocacia, mas não são suficientes. Além do conhecimento técnico e da atualização constante, os advogados também precisam desenvolver competências de gestão, socioemocionais e tecnológicas, que são cada vez mais valorizadas pelos clientes e pelo mercado.
Segundo os entrevistados, as competências jurídicas representam 39% da importância total, seguidas pelas competências de gestão (26%), socioemocionais (20%) e tecnológicas (15%). Esses dados mostram que habilidades jurídicas são fundamentais para a profissão, mas que há uma crescente demanda por competências de gestão, que envolvem planejamento estratégico, liderança, negociação, comunicação e marketing.
As competências socioemocionais também ganham destaque na pesquisa, principalmente as relacionadas à empatia, ao bom relacionamento com o cliente, ao controle emocional e ao trabalho em equipe. Essas habilidades são essenciais para lidar com situações de conflito, estresse, frustração e erro, que ocorrem na rotina da advocacia.
Por fim, as competências tecnológicas aparecem como as menos relevantes entre as quatro categorias, apesar de a pesquisa demonstrar que os escritórios estão, cada vez mais, incorporando recursos modernos. Isso pode indicar uma resistência ou uma falta de conscientização sobre a importância da inovação e da adaptação às novas ferramentas e plataformas digitais.
Quando perguntados acerca das habilidades que se mostram pouco desenvolvidas nos profissionais, o conhecimento jurídico e a atualização foram apontados em 25% dos casos. Outras que também apresentaram deficiência são: habilidade tecnológica (13%), especialização (11%), controle socioemocional (11%) e empatia e relacionamento com o cliente (10%). A gestão ficou em 9%. Bancas de maior porte destacaram a questão da tecnologia, enquanto os menores enfatizaram a competência jurídica.
Para tentar suprir essas lacunas, os escritórios investem em diferentes formas de capacitação dos seus profissionais. As principais são: financiamento de cursos para todos os advogados (41%), programas próprios para treinamento (36%) e financiamento de cursos somente para advogados específicos (31%). No entanto, 25% dos escritórios afirmaram que não possuem nenhuma estratégia de formação e treinamento.
Mapeando competências para a advocacia do futuro
O objetivo da pesquisa foi analisar as transformações na advocacia e as competências que os advogados do futuro devem ter. Para isso, foram definidos quatro eixos de competências:
Competências jurídicas: o conhecimento teórico e prático do Direito e as habilidades para exercer a advocacia;
Competências de gestão: a capacidade de tomar decisões, gerir recursos e planejar estratégias organizacionais;
Competências tecnológicas: o domínio e o uso de ferramentas e soluções tecnológicas;
Competências socioemocionais: os atributos relacionados à comunicação, à emoção, à ética, à cultura e ao comportamento.
De acordo com o mapa, as habilidades jurídicas foram consideradas as mais importantes (39%), seguidas pelas habilidades de gestão (26%), socioemocionais (20%) e tecnológicas (15%).
No entanto, os entrevistados não explicaram claramente o que entendem por habilidades jurídicas ou tecnológicas. As habilidades de gestão também foram pouco detalhadas. Já as competências socioemocionais foram descritas com profundidade, apesar de não terem sido tão valorizadas.
Conclusão
A pesquisa investigou o impacto das mudanças tecnológicas na advocacia, com foco na formação e competências dos profissionais jurídicos. Os resultados revelaram que a adoção de tecnologia varia de acordo com o tamanho e localização dos escritórios, afetando a demanda por habilidades específicas.
De maneira surpreendente, as competências de gestão ganharam destaque, indicando uma maior profissionalização dos escritórios.
Vale frisar que o futuro da advocacia não é uniforme e diferentes profissionais precisarão de competências diversas para se destacar no mercado de trabalho. Isso exige uma análise contínua das tendências, novas áreas de atuação e habilidades essenciais para o sucesso na advocacia moderna.
Texto retirado do site da Thomson Reuters
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